quinta-feira, 13 de julho de 2017

Amar-te-ei até o fim!



(Continuação do artigo anterior)

Estava com o coração ansioso…

A Pantufa não estava mesmo bem… Foi a primeira vez que ela deixou-se levar para a caixa transportadora sem fazer qualquer reação…

Nunca, mas mesmo nunca, a Pantufa queria ser levada na caixa transportadora. Mesmo nos últimos meses, quando a levei aos dois veterinários para a consultar, ela tornou-se ainda mais difícil quando a tentava levar na transportadora.

Mas desta vez, ela já tão fria, deixou-se meter na caixa. sem dizer nada, só olhava para mim com aquele olhar de um amarelo lindo que só ela tinha.

Quando cheguei à esta nova veterinária, percebi logo uma diferença na clínica. Estavam cães e gatos soltos pela clínica que logo me vieram cumprimentar…

Tive um bocado de receio, mas logo vi que aqueles companheiros de quatro patas eram as boas-vindas para uma veterinária que gostava mesmo do que fazia.

Já não me lembro se estava muita gente ou não… Pois como disse no artigo anterior, estava mesmo com a dor muito forte em meu coração, quando vi a Pantufa, em casa, no chão frio, rodeada de xixi… Nunca a vi em tal situação, ela que sempre se esmerava por estar sempre limpinha …

Então fui chamada para o consultório… E atendeu-me uma jovem doutora e percebi logo um à vontade a lidar com a Pantufa… Disse-lhe o que estava a acontecer nos últimos meses, e ela mediu-lhe a temperatura…

Percebi no olhar da veterinária que as coisas não estavam bem para a minha querida Pantufa…

E sim, a Pantufa estava com uma insuficiência renal crónica… os rins estavam a parar… então eis que a veterinária disse-me logo que ela tinha de ser internada o mais rápido possível para ser operada…


A Pantufa estava mesmo quieta… nunca a vi assim tão calma… como se as suas forças estavam mesmo no seu limite…

A Pantufa foi operada à hérnia porque o intestino estava preso na hérnia e na bexiga, porém os rins, mesmo com a operação, não estavam a funcionar… Por isso, ela teve de ficar internada …

Todos os dias ia visitar a Pantufa após o trabalho… Era muito difícil ver ali a minha querida Pantufa, a olhar para mim, como que a tentar comunicar-me uma mensagem que ainda não conseguia compreender…

Lembro-me, que quando ela me via, levantava-se logo e eu ficava com esperança… Mas a veterinária olhava-me de uma forma mais pessimista…

E quando chegava a casa, lá estava a Lady, sozinha, a olhar para mim… Ah, quanta tristeza… Eu bem lhe dizia que a sua companheira de tantos anos estava doente, mas ela vai voltar, dizia-lhe, ela vai melhorar…

A Lady começou a fazer algo que nunca tinha feito comigo… 

Com a Pantufa, ela tinha o costume de marchar encima da sua barriga e depois, deixava-se estar encima dela…





Nunca compreendi muito bem porque ela fazia isso… mas, a partir dessa altura, a Lady começou a fazer extamente o mesmo comigo… À noite, quando já estava deitada, lá vinha ela para cima da minha barriga, marchar um pouco e depois deixava-se estar encima de mim…

Percebia que a Lady estava com muitas saudades da Pantufa… Percebia-se no seu olhar, quando chegava ao final do dia, e a via ali a olhar com os seus olhos azuis a tentar perceber o por quê da Pantufa não voltar para casa…

E os dias foram passando e o estado clínico da Pantufa não se alterava…  Enquanto estava ali um tempinho com a Pantufa, via outros gatos, alguns deles que estavam para adoção… Um deles, estava na jaula bem abaixo da Pantufa, e chorava por mim, quando eu ia embora, dizia a veterinária…

Mas naquela altura, longe de mim saber o que estava para acontecer… Sabia bem que o temperamento da Pantufa não aceitaria outro gato em casa… Já tinha tido grande dificuldade em esta aceitar a Lady…


Um dia disse ao meu marido para visitar a Pantufa… Só eu ia à clínica porque o Paulo já tinha sofrido por morte de uma gata que estimava muito e que sofreu por doença e para além disso, tinha receio de ir lá vê-la…

Como vos disse nos artigos anteriores, a Pantufa nunca deixou o meu marido fazer-lhe festas. Aliás, quando estava junto do meu marido, ela mantinha-se longe de nós… Nunca o meu marido conseguiu sequer se aproximar da Pantufa. Ela não deixava e bufava-lhe, se ele se aproximasse dela.

Mas, passado alguns dias, a saudade bateu e então o meu marido Paulo foi vê-la… Eu já estava na clínica e eis que estava a fazer festas à Pantufa, quando ele entra na sala…

De imediato, a Pantufa pôs-se de pé… Meu marido ainda hesitou … Mas então, ela deixou-se acariciar por ele …

Nunca o meu marido tinha conseguido tocar-lhe e ela roçou-se nele como fazia comigo… Fez ainda um rom rom de contentamento… Meu marido acariciou o seu corpinho todo e ele chorou de alegria…

E a Pantufa olhou-nos nos olhos … Fixadamente olhou-nos e depois foi-se deitando novamente e então os seus olhitos foram olhando para um horizonte longínquo… para o alto…

Meu marido disse logo em lágrimas: 
- ela está a se despedir de nós!

- Não, não, ela está a melhorar – disse-lhe.

Não queria acreditar nisso. Mas depois desse olhar, a pantufa deitou-se como se estivesse satisfeita e em paz… Ainda lhe acariciei com muito carinho…

Ela manteve-se deitada e não mais nos olhou… Parecia estar com muito sono…

Eu e meu marido abraçamo-nos a chorar!

Mas eu repetia: - ela vai ficar boa!

Enquanto tudo isto acontecia, o meu marido viu, que do outro lado da sala, estava uma gata preta e branca a olhar-nos, atrás de uma jaula… e depois lentamente ela foi colocando a pata entre as grades a tentar tocar-nos… 

Na altura, eu não via mais nada para além da minha querida Pantufa…

Fomos para casa, e eu mantinha a esperança, pois não podemos desistir nunca!

Porém, no outro dia, recebi a notícia que mais temia... Quando a veterinária foi ver a Pantufa, logo de manhã cedo, ela já tinha falecido…

Mas, porquê? - perguntei à veterinária. Ela parecia estável, parecia que estava a melhorar... Ontem o meu marido veio visita-la, e ela nem gostava muito do meu marido, e até deixou-lhe fazer festas...

E a veterinária disse-me:
- Ela esperou pelo seu marido para se despedir dele também...

Nunca mais irei esquecer desta frase... Este foi o primeiro abanão que eu recebi pois ainda não conhecia a verdadeira personalidade os gatos...

Ali, no momento da sua despedida, a Pantufa me demonstrou que um gato ama, e ama muito, mesmo que não o demonstre, mesmo que não o queira demonstrar...

Nós, humanos, gostamos de racionalizar as coisas à nossa medida... Se um gato nos bufa, pensamos logo que ele nos está a rejeitar... 

Como tenho referido nestes artigos, que não são apenas para entreter, é preciso contar a verdadeira história dos gatos para os conhecermos melhor... 

Por isso, tenho partilhado neste blogue do que tenho vivido ao lado dos gatos que tenho adotado na minha vida. 

E sim, a Pantufa amava o meu marido muito, mesmo sem o ter demonstrado até o dia da sua despedida...

Só depois de o ter visto, é que ela finalmente pôde ir em paz... 

- Amar-te-ei até o fim! - esta foi a mensagem, que a Pantufa nos queria transmitir, quando se despediu de nós naquela noite, que foi a véspera da sua morte...

E como choramos esta perda... Era uma dor inconsolável... Nunca me tinha sentido assim...

Ao escrever este artigo, chorei por várias vezes, ao lembrar de como a Pantufa nos deixou... A perda de um animal que nos acompanhou durante tantos anos, só quem passou por isso, pode compreender a profundidade disto tudo.

Mas a culpa foi do sofá? Foi por causa do sofá preferido da Pantufa que ela ficou doente?



Ainda pensei que foi por causa disso, por algum tempo... 

Mas, depois falando com a veterinária que ainda tentou salva-la, ela disse-me que não... 

Poderia ter sido uma queda que a Pantufa teve, fazendo-lhe uma hérnia, que depois prendeu o intestino e a bexiga, parando-lhe os rins...

No entanto, as hérnias também podem ser de nascença. Como a Pantufa era gordinha, os veterinários que a viram antes, poderiam não ter notado a hérnia ao palpar. Por vezes, a hérnia é um buraco pequenino que não se nota e os gatos vivem, ainda bem, durante algum tempo, até que um orgão fica preso na hérnia, e então, começam os problemas.

Foi uma coincidência toda aquela história do sofá que foi mudado, e toda aquela situação dos apegos às coisas que os gatos, por vezes, têm...

Realmente, por vezes, as coisas acontecem, e não vale mesmo a pena ficarmos a tentar explicar o por quê, antes, temos de nos focar no "para quê" tudo isso aconteceu...

Já me disseram que cada qual tem o seu livro de história e a morte tem sempre uma desculpa.

Agora restava-me a minha querida Lady que ficou sozinha em casa, e sem mais ver a Pantufa...  Também eles, quando perdem um companheiro de vida, sofrem imenso...

Eu e meu marido começamos a ver um olhar muito triste na nossa querida Lady... 

Não, não podemos perder também a nossa querida Lady!


(continua no próximo artigo)