(Continuação do artigo anterior)
Como dizia no meu artigo anterior, os gatos apegam-se às
pessoas e por isso também se apegam às coisas que estas pessoas que eles amam,
mais usam.
Penso que isso é a razão por quê eles arranham aquele sofá
que mais é utilizado pelo seu humano
preferido da casa. Ou então quando eles veêm qualquer coisa nova que é trazido para a casa, e
por assim dizer, eles vão logo colocar a sua presença por meio de uma
arranhadela ou apenas roçar-se, espalhando ali o seu cheiro.
A questão de pertença que os gatos assumem para eles
próprios, é algo extraordinário que nunca imaginava que eles poderiam sentir. Longe
deles estarem a achar que estão a estragar as coisas dos seus tutores. O que
está em causa aqui é a tamanha fidelidade que eles têm por nós que se estende
às coisas que usamos na casa e até nas roupas que vestimos.
E como cheguei a esta conclusão?
Infelizmente da pior maneira, pois vivi com a minha primeira
gata Pantufa uma dessas experiências que nunca julguei que fosse possível.
Como tinha dito no artigo anterior, a minha gata Pantufa
gostava muito do sofá que utilizávamos quando víamos televisão. Quando não
estávamos em casa e mesmo se estava na cozinha, era ali no sofá da sala que a
Pantufa e a Lady mais estavam. A Pantufa esticava-se toda, mostrando aquela
barrigita preta tão amorosa com duas manchas de pelo branco.
No entanto, o sofá estava todo arranhado, quase a
desmanchar-se todo. Resolvemos então comprar outro sofá e jogarmos aquele fora.
Por acaso, como era um sofá-cama, uma instituição
interessou-se por leva-lo mesmo assim, já que a cama e o colchão ainda podiam
ser utilizados.
E foi assim, que o sofá velho onde a Pantufa dormia foi levado da casa, e logo a
seguir, um novo sofá veio para o mesmo lugar onde estava o outro.
Era um sofá novinho, de imitação de napa preto, que deixava
muito mais bonita a sala de entrada da casa.
Porém, depois do sofá lá estar, eis que a Pantufa fez algo
inimaginável: fez um cocó encima do sofá!
Ela nunca tinha feito qualquer das suas necessidades fora da
caixinha da areia. Foi a primeira vez que tal aconteceu.
Eu e meu marido ficamos estupefatos com tal situação tão sem
sentido.
Para nós, humanos, aquela ação foi algo que nunca poderia se
esperar de um animal que já vivia connosco há cerca de dez anos.
A Pantufa já vivia há cerca de dez anos na nossa casa. Nunca, em momento algum, ela fez xixi ou cocó fora da caixinha da areia. Mesmo quando
ainda era ainda tão pequenina, nunca vi em lado algum da casa, qualquer coisa
dessa ou qualquer sujidade.
A Pantufa foi sempre uma gata extremamente asseada com o
seu pelo. Aliás, o seu pelo negro brilhava ao sol de tão limpo que estava.
Porém, na altura não compreendi a mensagem da Pantufa. Não tinha
conseguido compreender o que ela me queria dizer.
Zanguei-me e deixei de falar com ela. A Pantufa, quando
não me via a olhar e a falar com ela, ficava mesmo magoada e triste. Foi assim
que eduquei a Pantufa, e claro, passadas algumas horas, voltava a falar com
ela, pois não aguentava ficar assim por muito tempo. Bastava fazer isso
e ela percebia logo os seus limites.
No entanto, desta vez, isso não adiantou.
Depois do novo sofá vir para casa e o seu sofá ter ido
embora, a Pantufa nunca mais voltou a ser a Pantufa de antes.
Todos os dias chegava a casa e sempre via, aqui e ali, xixi e
cocó. No início, mostrava-me zangada e
dizia-lhe que ali não se faz.
No entanto, os dias foram passando e todos os dias era
surpreendida, especialmente com uma pocinha de xixi a meio da sala.
Levei-a ao veterinário e como a Pantufa continuava a
alimentar-se bem e até mantinha o seu peso, disseram-me que era um problema
comportamental.
Foi nessa altura que ouvi falar do tal apego que os gatos
têm às coisas da casa onde moram, e por vezes, eles ficam ofendidos quando
jogamos fora, certos móveis e roupas, onde se deitam ou estão mais tempo…
Isso parecia-me um absurdo, pois o que aquele sofá velho
tinha de tão especial para a Pantufa?
Os dias foram passando e as coisas foram ficando cada vez piores.
Resolvi levar a Pantufa a outro veterinário e igualmente
este disse-me o mesmo, e até aconselhou-me a separar a Pantufa num lado da casa até passar esta tal crise comportamental...
As poças de xixi foram aumentando. E então, ela começou
também a fazer xixi na cama onde eu dormia. Por causa disso, acabei por aceitar o conselho do tal veterinário e acabei por colocar a Pantufa num canto da casa
onde tivesse a areia, a água e a comida e assim mantivesse um pouco de higiene na casa.
Quando fiz isso, Lembro-me até hoje do olhar da Pantufa a fitar-me,
um olhar profundo que me entrava pelo coração adentro… Não percebia toda aquela
situação… Não percebia o por quê de ela estar a fazer aquilo após dez anos de
convivência...
Sim, ela nunca deixou de comer, aliás mantinha tudo normal na companhia da sua amiga Lady. Como poderia deixar a
minha gata a um canto da casa? Na altura não sabia das fraldas nem nada disso. Os
veterinários onde levei a Pantufa nada me disseram acerca disso. Mas não consegui deixa-la ali a um canto da casa.
Não aguentava ver a Pantufa sozinha e por isso deixava-a livre, colocando plásticos encima da cama e móveis para que ela não os sujasse com o xixi e o cocó. Foi a única maneira de a ter a andar de um lado para o outro e manter a casa com mais higiene.
Passaram-se alguns meses. Na altura estava a estudar à noite
e a trabalhar de dia. Chegar a casa cansada, e ver que a Pantufa continuava a fazer xixi em vários lugares da casa, me deixava cada vez mais preocupada…
Foram meses de grande angústia …
Então comecei a tentar localizar outros veterinários no
lugar onde eu morava. Até, lembro-me de pedir a um deles que viesse a casa para
vê-la…
E então, eis que um dia cheguei a casa e encontrei a Pantufa na casa de
banho, parada a um canto, sobre o chão frio e cheio de poças de xixi aqui e ali.
Não aguentei, agarrei nela, embrulhei-a num cobertor e
coloquei-a numa transportadora.
Tinha ouvido falar de uma veterinária, ali perto onde eu
trabalhava, e fui pela rua já quase noite, a chorar e quase a implorar a Deus que esta
veterinária me ajudasse a saber o que a Pantufa tinha.
Não podia ser só um problema comportamental. Desta vez,
quando vi a Pantufa na casa de banho, senti-a quase gelada… não podia ser só uma birra,
tinha que haver qualquer outra coisa que estava a acontecer para além do tal problema comportamental …
(continua no próximo artigo)
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